terça-feira, 16 de junho de 2009

O Jardim da Oposição: a EAV nos anos de chumbo

Créditos à SEC-RJ

Parque Lage

Durante o governo Ernesto Geisel, entre a ditadura militar e o processo de redemocratização do país, a história das artes e da cultura no Rio de Janeiro confunde-se com a abertura de um espaço inédito na cidade: a Escola de Artes Visuais (EAV), no Parque Lage, criada em 1975 pelo artista plástico Rubens Gerchman, no local onde funcionava o Instituto de Belas Artes do Estado. A efervescência cultural criada pelos cursos da EAV e a abertura de um espaço para as novas possibilidades estéticas concentraram, no Parque Lage, os principais eventos, debates, exposições, leituras de poesia e de teatro, performances, happenings e instalações produzidas no Rio de Janeiro naquele período.

Agora, patrocinada pela Secretaria de Estado de Cultura, através do Edital de Artes Visuais 2008, a exposição O Jardim da Oposição - que será inaugurada no dia 19 de junho - mostrará parte significativa da produção artística e cultural realizada na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, entre os anos 1975-1979.

Com curadoria de Heloisa Buarque de Hollanda e Helio Eichbauer, a exposição contará com registros audiovisuais – projeções de filmes Super 8 de época, curtas e entrevistas - documentos impressos, fotografias do período, iconografia, eventos de poesia e debates. Também haverá a remontagem da exposição de gravuras “14 para viagem”, com trabalhos de professores que atuavam no Parque Lage. O Jardim da Oposição, segundo os curadores, é uma homenagem a Rubens Gerchman.

“A mostra resgata a importância da Escola de Artes Visuais do Parque Lage e sua influência decisiva nas artes e na cultura dos anos 80. Nosso trabalho na Secretaria está focado na retomada da excelência no ensino da instituição e na ampliação do acesso da população à EAV. Estamos comemorando o fato de a exposição acontecer num momento de transformação da EAV, quando se traça o Plano Diretor da escola”, diz a secretária Adriana Rattes.

Na exposição, serão utilizados documentos do acervo da EAV, além de arquivos pessoais de professores e alunos. “Ali, tínhamos um território livre, não neutro, mas livre dentro de um período bastante repressivo”, lembra Eichbauer que, com Lina Bo Bardi, foi responsável pela Oficina Pluridimensional, experiência que articulava a dança, o espaço, a construção de maquetes, a pintura e a body art.

“O que mais me impressiona nesta exposição, além da abordagem criteriosa e, ao mesmo tempo calorosa cunhada por Helio Eichbauer e Heloisa Buarque de Hollanda, é sua atualidade e atemporalidade. Olhar essas fotos, filmes e depoimentos nos dá a exata dimensão do que foi o projeto de escola aberta, não acadêmica, capitaneado por Gerchman, inserido no contexto dos anos 70. Nos permite enxergar o quão atuais e revolucionárias são as propostas daquela escola que esta escola hoje persegue através de outros caminhos e outros métodos”, diz Claudia Saldanha, diretora da EAV/Paque Lage.

Na segunda metade da década de 70, a Escola de Artes Visuais reuniu cerca de quarenta artistas renomados, oferecendo 65 oficinas, que formaram mais de dois mil alunos. Construiu-se um ambiente transdisciplinar do qual participaram artistas e intelectuais de peso, tais como: Helio Eichbauer, Lina Bo Bardi, Roberto Magalhães, Celeida Tostes, Sergio Santeiro, Lygia Pape, Alair Gomes Claudio Kuperman, entre outros.

“A EAV, por volta de 76, ao lado do MAM, já era considerada a grande usina cultural do Rio de Janeiro. Foi na EAV que a poesia marginal, a mais importante expressão literária de resistência, encontrou seu espaço de criação e de realização de performances em eventos que reuniam um enorme público jovem em torno da literatura, coisa até hoje praticamente inédita no mercado literário. Foi na EAV que Francisco Bittencourt sediou nossa primeira revista gay, Lampião. Foi ali que os psicanalistas da vanguarda lacaniana sediaram a Escola Freudiana do Brasil. Foi na EAV que o maestro e compositor Joachim Kollreutter organizou os históricos concertos de música dodecafônica. Enfim, a vida cultural do Rio e do Brasil foi impulsionada pela EAV naquela época”, avalia Heloisa Buarque, curadora e idealizadora da exposição.

Ambientes

A exposição será montada em quatro ambientes. No primeiro, a apresentação da exposição, com painéis e textos históricos: folder de abertura da Escola, o texto que dá nome à exposição “O Jardim da Oposição”, de Wilson Coutinho, escrito em 1989, fotografias e iconografia da época.

O segundo ambiente abrigará a remontagem da exposição de gravuras “14 para Viagem”, que na época reuniu professores da Escola de Artes Visuais como Antonio Grosso, Avatar Moraes, Eduardo Sued, Rubens Gerchman e Helio Eichbauer, entre outros.

Em outra sala serão realizadas exibições de filmes do curso Oficinema, de Sergio Santeiro, com depoimentos de Santeiro e de Xico Chaves; além de registros fotográficos de shows de música com Caetano Veloso, Gilberto Gil, Milton Nascimento e Fagner, entre outros. Estes shows, montados por Xico Chaves a partir do projeto Verão a Mil, também conhecido como Tenda Voadora, aconteciam sob uma grande tenda de lona, feita de antigos pára-quedas de guerra, armada nos jardins do Parque Lage, e reuniam cerca de mil e quinhentas pessoas por evento. O formato destes eventos inspirou a montagem, logo depois, no Arpoador, do primeiro Circo Voador, projeto cultural que até hoje é uma referencia para a cidade. Nesta sala, também estarão os registros dos eventos de poesia, como “Pipa”, de Xico Chaves e da Oficina de Artes do Fogo, de Celeida Tostes.

No quarto ambiente haverá uma sala de projeções com filmes e montagens multimídia como, por exemplo, o registro inédito da obra Uirapuru, happening a partir do poema sinfônico de Villa-Lobos, produzido pela artista plástica Neide Dias de Sá, com depoimentos do cenógrafo Marcos Flaksman, responsável pela oficina de cenografia na época, e do próprio Eichbauer. Os registros fotográficos são de Celso Guimarães, professor de fotografia da EAV, e de Beth Pereira, fotógrafa e artista plástica que na década de 70 cursava a oficina Pluridimensional. O projeto da exposição é assinado por Eichbauer e Luiz Henrique Sá.

Serviço

Exposição: O Jardim da Oposição

De 19 de junho a 30 de agosto

De segunda a quinta, de 9h às 22h

Sextas, sábados e domingos, de 9h às 17h

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